Competência Jurisdicional
Código de Leis
A competência jurisdicional dos tribunais Bnei Noaḥ define a autoridade legal concedida a um tribunal ou corte para julgar determinados tipos de casos. Nas comunidades que seguem as Sete Leis, esta competência é estabelecida com base nos princípios derivados da tradição judaica, como o Talmud (Sanhedrin 57a) e as obras de Maimônides.
O sistema legal judaico reconhece que a justiça constitui o pilar central das Sete Leis de Noaḥ, que não apenas proíbe a injustiça, mas também estabelece a obrigação positiva de criar sistemas jurídicos funcionais com tribunais e juízes capacitados. Tal estrutura mantém a ordem judicial noaíta, harmonizando a halaḥá com as realidades contemporâneas.
Naḥmânides (Bereshit 9.5) ensina que a justiça universal das Sete Leis demanda autoridade local para punir violações como homicídio ou roubo, refletindo a responsabilidade comunitária de fazer justiça dentro dos parâmetros da Torá. O Talmud (Sanhedrin 57a) detalha penas específicas pra cada uma das leis de Noaḥ, sugerindo que a jurisdição abrange casos diretamente ligados a essas proibições.
Critérios Determinantes da Competência
A determinação da competência jurisdicional nos tribunais noaítas pode ser sistematizada em Competência Territorial, Competência Material e Competência Pessoal.
Competência Territorial
Tribunais com jurisdição sobre determinada localidade geográfica têm autoridade para julgar os casos ocorridos nesse território. Esta legitimidade é baseada na premissa de que cada comunidade deve estabelecer seus próprios juízes, conforme indicado nas interpretações rabínicas das Sete Leis.
Competência Material
Refere-se à natureza do caso em questão. Os tribunais Bnei Noaḥ têm competência específica para julgar violações das Sete Leis: Estabelecer sistemas de Justiça (Dinim, דינים), Não ofender o Nome do Criador (Bircat Hashem, ברכת השם), Não fazer idolatria (Avodá zará, עבודה זרה), Não fazer relações sexuais proibidas (Guilui araiot, גילוי עריות), Não cometer assassinato (Shefiḥat damim, שפיכת דמים), Não roubar (Guezel, גזל) e Não comer parte de um animal vivo (Ever min haḥai, אבר מן החי).
Competência Pessoal
Está relacionada às partes envolvidas no litígio. As cortes noaítas têm jurisdição sobre aqueles que aceitam abertamente as Sete Leis como base moral e legal (Sanhedrin 57a), independentemente de sua origem étnica ou religiosa.
Conflitos de Jurisdição
A interação entre o sistema legal noaíta e os sistemas civis pode gerar conflitos de jurisdição, especialmente em casos que tocam tanto as Sete Leis quanto as leis locais. O princípio haláḥico de “Diná demalḥutá diná” (A lei do país é a lei) reconhece a legitimidade dos sistemas legais seculares e estabelece parâmetros para resolver questões de conflito ou sobreposição.
Primazia da Lei Local
Em questões civis seculares, prevalece geralmente o sistema legal do país onde as partes residem.
Arbitragem Voluntária
Muitas comunidades estabelecem tribunais que funcionam como instâncias de arbitragem voluntária, cujas decisões são moralmente vinculativas para os membros, mas legalmente executáveis apenas quando reconhecidas pelo sistema jurídico secular.
Complementaridade
Quando o sistema Bnei Noaḥ atua como complemento ao sistema civil, abordando dimensões éticas e religiosas que podem não ser contempladas pela legislação secular.
Determinação da Competência
O processo sistemático para determinação da competência jurisdicional deve contemplar a análise do fato, a identificação territorial, a verificação da aceitação e a avaliação de potenciais conflitos. Na prática, disputas entre membros de uma mesma comunidade ou entre comunidades diferentes exigiriam a identificação territorial equivalente, garantindo que as partes reconheçam a autoridade do tribunal noaíta e que o processo seja julgado corretamente dentro da jurisdição dele.
Considerações Práticas Modernas
Nas comunidades contemporâneas, os tribunais noaítas têm o desafio da formalização jurídica, que permite a atuação dentro do marco legal de arbitragem reconhecido pelos estados, decidindo sobre questões noaíticas de forma complementar às decisões dos tribunais civis.
Em contrapartida, os próprios membros dessas comunidades podem adotar iniciativas que simplificam a determinação de competência, como o estabelecimento de cláusula de eleição de foro (Tniat shiput, תניית שיפוט) em contratos firmados com pessoas de outras comunidades Bnei Noaḥ. Esta cláusula estabelece previamente qual será o tribunal competente para julgar eventuais disputas relacionadas ao contrato. Quando as partes incluem esta cláusula em um contrato, elas estão determinando antecipadamente onde qualquer litígio futuro deverá ser processado e julgado.
A competência jurisdicional no contexto das Sete Leis representa um equilíbrio delicado entre a autoridade moral da tradição religiosa e o reconhecimento pragmático dos sistemas civis. Este equilíbrio permite que as comunidades noaítas mantenham sua identidade intacta enquanto participam de um escopo mais amplo da sociedade. A clareza sobre quais casos pertencem a qual tribunal e os critérios para determinar a autoridade em casos específicos são fundamentais para a legitimidade e eficácia do sistema jurídico que a a Torá exige dos Bnei Noaḥ.
Qualquer um que aceite os Sete Mandamentos e tenha cuidado em fazer isso é um justo entre as nações do mundo e tem uma parte no próximo mundo.
- Maimônides, Mishnê Torá